Serra Gaúcha Igreja Matriz São Pedro: a imponente obra erguida na década de 1920

Quando eu era criança, lembro como ficava impressionada ao participar das missas na Igreja Matriz São Pedro. Meus olhos de criança, sempre curiosos e em alerta, admiravam os vitrais e as imagens, como quem descobre um tesouro. O eco provocado pela abóboda me levava para dentro dos filmes de terror, que eu adorava. Mais tarde, o livro O Nome da Rosa, do escritor italiano Humberto Eco, trouxe um novo significado para os símbolos e arquitetura católica. Havia mistério e segredos que eu queria compreender. As teorias sobre os Iluminatti e a Maçonaria causavam ainda mais curiosidade e eu lia tudo o que estivesse ao meu alcance. Nos anos 2000 veio a febre O Código Da Vinci, agregando ainda mais simbologia aos templos. Uma nova carga de signos preencheu meu olhar. Não me intitulo fotógrafa. Sou apenas uma repórter que se atrai pelo passado e por histórias de vida. Eu vejo história, memória e inspiração por cada canto dessa cidade. Fiz essa foto da Igreja Matriz São Pedro em 2015. Foi o dia em que o cenário falou com a minha memória. "Quando eu fotografo o que vejo, eu fotografo o meu lado do mundo" (Sebastião Salgado)." Obra de restauração devolve 90% da originalidade à Igreja Matriz São Pedro de Garibaldi Reproduzo aqui a matéria escrita pela jornalista Milena Schäfer no Pioneiro, em 29/11/2009 Até o badalar dos quatro sinos da Igreja Matriz São Pedro, no centro de Garibaldi, soa diferente. Eles são apenas um dos elementos contemplados com a restauração que recuperou 90% da originalidade da imponente construção erguida entre 1921 e 1924. O investimento, que já chega aos R$ 2,6 milhões, partiu da Paróquia do município e, assim como na construção original, contou com a mobilização da comunidade. A reinauguração da igreja será celebrada nesta terça-feira (3), em um ato que contará com representações da cidade, bem como agentes que contribuíram para a recuperação do prédio quase centenário. — A restauração trouxe mais unidade à Paróquia, muitas pessoas puderam matar a saudade com a recuperação da memória da cidade e, além disso, a Igreja tornou-se ainda mais motivo de orgulho para os garibaldenses — afirma o frei Jadir Segala, pároco idealizador da recuperação. O religioso atua em Garibaldi desde 2012 e foi quem começou a olhar para o processo de deterioração pelo qual o maior santuário da cidade passava. Em 2014 ele contratou um profissional para avaliar a estrutura e o laudo apresentado apontava muitos problemas, sendo a umidade, à época, o agravo mais iminente. A decisão de instalar nos rodapés internos uma pedra que descaracterizava a originalidade da igreja gerou polêmica na cidade e chegou a ser embargada pelo Ministério Público que, baseado em um parecer emitido pela equipe especializada do órgão, entendeu que a remoção das pedras causaria ainda mais danos ao patrimônio. Os últimos dois invernos sem umidade, na ótica do Frei, confirmam que a escolha foi acertada. Outras questões como a rede elétrica defasada ainda ameaçavam a longevidade do prédio. Além de ser o principal ponto de celebrações religiosas, a Matriz também integra duas rotas turísticas do município (Rota Religiosa e Arquitetura do Olhar) que, nos últimos anos, desponta no setor com uma série de atrativos e eventos, como o Garibaldi Vintage. — A Igreja estava se deteriorando, alguém, um dia, ia ter que fazer isso antes que acontecesse alguma coisa — afirma o Frei que, em 2015, tomou a decisão de dar início ao ousado projeto de restauração integral, contando com a coordenação técnica da arquiteta garibaldense Iris Schmitt e execução de uma equipe especializada da ARS Arte Sacra, de Salvador do Sul. O projeto foi desenvolvido ao longo de 2016, com início das obras no dia 13 de fevereiro de 2017, após aprovação do Conselho de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (Comphac) de Garibaldi. O investimento contou com contribuições da comunidade, assim como na primeira versão da obra, que até hoje exibe nos exuberantes vitrais os nomes de famílias que colaboraram na época. Uma campanha lançada pela Paróquia presenteou com uma miniatura da Igreja Matriz os que participaram desta vez. Há que se concordar que, o maior presente, é a cidade toda que ganha. Uma construção histórica Um incêndio que destruiu a velha igreja da cidade no dia 18 de junho de 1920, motivou a construção da Igreja Matriz atual, inaugurada em 15 de março de 1924. A planta inspirada na Basílica de Lourdes foi trazida diretamente da França pelo Frei Bruno de Gillonnay. O engenheiro Agostinho Mazzini foi responsável pela execução da obra que, ao longo de quatro anos, mobilizou a comunidade. No altar, a imagem de São Pedro, padroeiro de Garibaldi, ladeada pelas imagens de Nossa Senhora de Fátima e São Luiz, guardam até os dias de hoje a fé e a história do principal ponto de celebração da cidade predominantemente católica. Herança dos imigrantes que colonizaram a região, na segunda metade do século XIX, a religiosidade faz parte da história de Garibaldi, que recebeu os primeiros Freis Capuchinhos em 1886. Entenda como foi a restauração Entregue dois meses antes do previsto, a obra é motivo de orgulho para a arquiteta responsável, que chegou a celebrar o casamento e o batismo de seu filho na igreja, em pleno processo de restauração. As celebrações, na verdade, nunca foram completamente interrompidas e, agora, a procura do local para celebrações parece estar ainda maior, conforme avaliação do Frei. Após o trabalho de um microbiologista especializado em rastreio, que desenvolveu um estudo de cores, infiltrações, etc., Iris produziu a volumetria 3D da igreja, que também recebeu visitas técnicas de estudantes ao longo do processo de restauração. A obra de investimento milionário foi dividida em três etapas: a primeira, contemplou o altar e os vitrais; a segunda, deu conta da da nave central e das naves laterais; e a terceira etapa foi externa. O processo de raspagem e prospecções foi marcado por uma série de descobertas, como o tom amarelo da pintura original e ladrilhos estampados ocultados por um piso vinílico instalado em alguma década. Atrás do altar, a arquiteta mantém o registro das alterações feitas no prédio ao longo dos anos. Em 1924, a raspagem mostra a tinta original; em 1964, uma pintura tornou verde a área externa do prédio; em 2002, a cor foi reforçada; e, em 2019, o amarelo é recuperado. Obedecendo às diretrizes técnicas de uma restauração, Iris conta que o trabalho foi mais voltado à recuperação do que à intervenção, sendo criados elementos somente quando a referência histórica não existia. Uma sequência irregular de ladrilhos, pinturas artísticas feitas após a inauguração e desgastes no piso original foram mantidos. — As falhas não foram cometidas por mal e também contam a história. É uma igreja de 95 anos, não precisa parecer nova — destaca a arquiteta. Piso A igreja de Garibaldi reúne 11 diferentes estampas de pisos hidráulicos. Dez eram conhecidos e um foi encontrado atrás do altar após um processo de raspagem do piso vinílico. Todo piso passou por uma limpeza e foi protegido com uma camada de verniz. Iluminação Fontes de energia elétrica não eram realidade em Garibaldi na década de 1920. Sendo assim, a versão original da igreja dispunha de candelabros com iluminação de velas. De forma pensada, a construção também foi posicionada no sentido Leste-Oeste, de maneira a aproveitar a luz do sol que penetra pela frente do prédio nas primeiras horas da manhã e pelo vitral atrás do altar no fim da tarde. Com a restauração, novos lustres foram instalados. Segurança Mesmo sob exigências pertinentes a uma nova realidade de construções, o Plano de Prevenção e Proteção contra Incêndios (PPCI) foi elaborado e aprovado para o prédio, que também passou a contar com um para-raios sobre sua torre mais alta como forma de prevenção. Por não estarem em conformidade com as normas atuais, os degraus internos de granilite (material com base de concreto que utiliza agregados como mármores e granitos) provavelmente instalados nas décadas de 1940 ou 1950, foram compensados com uma estruturas de madeira que foram encaixadas, melhorando a usabilidade dos frequentadores. A medida não altera a originalidade da obra e pode ser removida com facilidade. Nova Igreja A mobília que não integrava a antiga liturgia das celebrações foi criada de acordo com o estilo da igreja. Da mesma forma o altar, foi recriado a partir de referências históricas. O púlpito e o confessionário, que não integram a liturgia moderna, foram restaurados e instalados próximo à entrada da igreja. Os elementos foram mantidos para compor a leitura histórica a ser feita pelos visitantes. Vitrais O colorido dos vitrais salta aos olhos de quem acessa a igreja durante o dia. As estruturas originais passaram por limpeza e foram preservadas. Segundo a arquiteta, na época, os vitrais foram fixados diretamente na alvenaria. Via Sacra Os quadros de madeira que retratam as passagens bíblicas da Paixão e Morte de Jesus Cristo também foram restaurados. Algumas peças estavam fragmentadas, sendo reconstruídas pela equipe de restauração. Pintura decorativa O trabalho de raspagem realizado pelos restauradores revelou que as pinturas decorativas originais da igreja eram ainda mais bonitas e detalhadas do que as que se mostravam antes do início do trabalho de investigação. Anjos celestes e detalhes como os "tijolinhos" desenhados nas abóbodas despertaram lembranças nos frequentadores mais antigos da paróquia. Som Um órgão de tubos que fica em um mezanino e acompanha o desenho da construção da igreja não entrou no pacote do restauro, mas está nos planos da administração. Caixas de última geração foram instaladas ao longo do prédio, com um formato discreto que melhorou a microfonação dos padres, oradores e músicos que participarem das celebrações. Os antigos sinos de bronze que ficam na torre foram regulados, procedimento que melhorou o som emitido por eles. VISITE A IGREJA M